"Sou pago para defender o gol da minha equipe. É exatamente isso que vou fazer contra o Santos. Acho difícil que ele marque o milésimo em mim". A declaração confiante foi dada pelo goleiro Jurandir Salvador ao Jornal A Tarde, no dia 16 de novembro de 1969, antes da partida entre Bahia e Santos, no estádio Fonte Nova, pela primeira fase do torneio Roberto Gomes Pedrosa. A "direta" de Jurandir foi para Pelé, que estava prestes a marcar o seu gol mil.
Diante de pressões externas e de 37 mil torcedores, o arqueiro fez um pacto com o elenco tricolor para impedir a marca histórica do Rei.
- Eu não acreditava que ele ia fazer. O plantel era muito unido e nós fizemos várias reuniões. Tínhamos Elizeu, que foi formado no Santos, ele sabia tudo deles. Nós sabíamos de tudo do Santos. O grupo se fechou para não tomar o gol.
Parte da torcida queria ver o gol mil e fazer a festa em Salvador, mas a torcida do Bahia não estava nem aí para a marca. Baiaco abriu o placar para os donos da casa e Jair Bala empatou para o alvinegro. Entre vaias e aplausos, o jogo terminou 1 a 1. Outro personagem da partida era o árbitro Arnaldo Cezar Coelho, que ainda estava no início da carreira.
Na histórica partida, Jurandir foi o último jogador a entrar em campo, ladeado do técnico paraguaio Fleitas Solich - que havia treinado o Real Madrid de Di Stefano e Puskás. O treinador blindou o goleiro na semana que antecedeu o jogo e o deixou concentrado longe do elenco. Mas, todo cuidado não foi o suficiente para impedir o assédio.
Um ex-deputado estadual e ex-presidente e diretor do Bahia ameaçou a família de Jurandir e ofereceu dinheiro para que o gol acontecesse naquela tarde. O dinheiro oferecido era em cruzeiros novos, que trazendo para o real daria o equivalente a R$ 700 mil.
- Ele me ofereceu dinheiro e disse que eu ficaria independente para o resto da vida. Mas eu disse que minha dignidade não tinha preço. Eu disse que se ele tocasse na minha família era ele que responderia. Depois do jogo ele sumiu. Eu fui e logo abri a boca com a imprensa. Graças a Deus fui considerado no dia a principal figura da partida. Dizem que não fui inteligente, mas com o passar do tempo vi que aquilo era insignificante.
Jurandir lembra que não teve vida fácil naquele duelo. Ele afirma que Pelé rondou a pequena área em, pelo menos, dez lances.
No dia seguinte, outro jornal da capital baiana se referiu a Jurandir na manchete como "O goleiro que não quis entrar para história". Hoje, com 72 anos, ele diz que não se arrepende e acredita que fez o que era certo.
Natural de Afogados da Ingazeira, no Sertão de Pernambuco, ele se mudou para Caruaru com 7 anos de idade. Começou a carreira no Central de Caruaru, depois foi para o CSA e de Alagoas foi para o Bahia, onde ficou por 10 anos, depois ainda defendeu Sampaio Corrêa e Sergipe. Mas, o coração do hoje "Seu Jurandir" é tricolor baiano. E essa paixão ele tenta passar para o neto João Lucas, de apenas 1 ano e 5 meses. (Globo Esporte)
Nenhum comentário:
Postar um comentário